segunda-feira, 24 de março de 2008

PARTE 6 - Noites de gala

Uma vez por ano, o restaurante era fechado, à noite, por um grupo de políticos para uma espécie de confraternização. O espaço atendia, diariamente, cerca de 400 pessoas. Nesta noite, o público chegava a quase 500. O salão era divido em quatro partes, e os garçons e os busboys ficavam fixos em suas respectivas alas. A coisa era tão organizada, que cada ala tinha a sua própria caixinha de gorjetas, cujo total de cada noite era rateado entre os integrantes daquele grupo. Era justo.

Nesta noite especial, no entanto, o negócio era mais livre, e a caixinha praticamente não fazia parte do roteiro. Cada um ficaria com a gorjeta que os clientes decidissem presentear. E a coisa começava cedo. Logo na chegada – limusines paravam umas atrás das outras em frente ao restaurante para deixar os convivas –, alguns já distribuíam presentes.

- Good evening, young boy! Spend it with your girlfriend next weekend. But do not forget: Red wine all night long! – disse um senhor simpático, com cara de Papai Noel, colocando uma nota de 100 dólares no bolso do meu terno, mas alertando que eu mantivesse seu cálice de vinho tinto sempre cheio.

A distribuição de gorjeta se repetia durante a noite inteira, em um ambiente elegante, com comida farta e deliciosa, Jack tocando de tudo um pouco ao piano, mulheres altas, lindas e espertas, champanhe gelada e vinhos tintos e brancos franceses e californianos, charutos cubanos (ainda que seja proibida a venda de charutos cubanos nos Estados Unidos), homens engravatados e endinheirados, muitos com os olhos arregalados balançando freneticamente copos de uísque com gelo, os rumos da política de Nova York em debate permanente e em voz alta, o Chef exaltadíssimo com os elogios dos clientes, o dono do restaurante – uma pessoa muito agradável e solidária – sorria sem parar, e o bartender, Oswaldo, brasileiro de família tradicional do Maranhão e que havia sido expulso de casa aos 20 anos porque era gay, era o mais contente de todos com o acúmulo descomunal de gorjetas em troca de seus drinks fantásticos.

Por alguns instantes, pensei que presenciava uma cena de um filme. Eu não era nem o ator principal nem o coadjuvante. Mas era um privilegiado. Um observador dentro da cena. Sem ninguém perceber, eu trabalhava, servia a clientela, embolsava minhas gorjetas e prestava atenção aos movimentos, aos sorrisos, aos abraços, aos flertes, às atitudes convenientes e inconvenientes. Eu fiz parte da cena, sem que ninguém notasse. Talvez nem eu mesmo tivesse a noção do que estava ocorrendo ao meu redor: uma típica festa da elite americana, num restaurante ao lado do Central Park, em Nova York. Agora, duas décadas depois, não consigo segurar um riso ao lembrar de mim mesmo, um cara de 20 anos, correndo com uma bandeja pelo salão chique, trabalhando duro e ganhando dinheiro para gastá-lo, integralmente, no final de semana seguinte em algum lugar da cidade ao lado de uma mulher.

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